“Querida, não pense que a pessoa tem
tanta força assim a ponto de levar
qualquer espécie de vida e continuar
a mesma.Até cortar os próprios defeitos
pode ser perigoso. Nunca se sabe qual é o
defeito que sustenta nosso edifício inteiro,
nem sei como lhe explicar minha alma.
Mas o que eu queria dizer é que a gente é muito
preciosa.”
– Trecho de carta escrita por Clarice Lispector.
Muitas mulheres sonham em ficar grávidas, constituir família e todas as boas lembranças e descobertas que essa experiência pode trazer. Quando têm filhas, as meninas são companheiras das mães, brincam juntas jogos de vestir e maquiar experimentam os sapatos de salto alto, roubam o batom e se pintam e no reflexo do espelho, a menina que passa a sombra nos olhos pela primeira vez, quase sempre busca a inspiração na própria mãe.
A aproximação entre filhas e mães é dada devido ao mundo feminino, os gostos, curiosidades e mesmas fases de vida, que as transformam em duas parceiras e familiares confidentes durante anos, até o momento que os filhos começam a buscar suas próprias crenças e descobertas e o conflito pode causar eventuais brigas, afastamento na relação ou mesmo não voltarem a se falar. Muitas vezes os laços são reatados e a aproximação também, após conversas, amadurecimento vindo da idade, compreensões, paciência e respeito.
A artista russa Alla Mirovskaya encontrou no conflito dessa época a inspiração para realizar um ensaio de fotografia baseado em sua mãe. A reflexão que a motivou foi que ao nosso redor, as pessoas são muito mais distante de nós mesmo, fisicamente e mentalmente, do que nossas mães, no entanto, estar relacionado não garante estar perto.
Partindo desse ponto e de lembranças Mirovskaya buscou entender de quem foi a culpa do isolamento entre ambas. Eram suas disputas e diferenças? No final, remoendo as memórias e entre idas e vindas nas recordações, ela decidiu que isso não faria diferença. O que importava no momento, é que a pessoa que ela se tornou agora, queria a reaproximação e sentir novamente o calor maternal como sentira anos antes, na infância.
A sensação estranha e incômoda que havia se estabelecido entre elas, anos depois virou compreensão e resultou na no acesso de uma a outra. A ideia é fixar momentos da vida da artista que são para ela preciosos, além de ser uma fonte de compreensão de si mesma e da própria vida, retratando a mãe, como uma mulher comum, com suas qualidades pessoais e defeitos, seu caráter que a define, seu lado sábio, poderoso e também o lado fraco, maduro e mau. Qualquer coisa que ela pode ser, além de somente mãe.
A imagem distante é rompida com a transformação da mãe em uma mulher comum, próxima dela e de qualquer outro ser humano. A série Distant and Close expõe mais de 10 fotografias da mãe em momentos pessoais, como se maquiando ou arrumando o cabelo em contra posição de fotos da própria artista, a filha em situações parecidas. Tão próximas e tão distantes, tão parecidas e diferentes, assim como todos os laços familiares.
O processo documental durou um ano e meio e fez a artista redescobrir uma nova visão e relação sua com o mundo, de uma mulher mais madura e segura de si, que já encontrou suas crenças, viveu descobertas e hoje já não busca o confronto familiar que resulta na busca da identidade. Com a idade e as fases de vida se aproximando as da sua mãe e o distanciamento não só das gerações, mas como também do tempo, possibilitou o começo de uma nova fase entre mãe e filha e entre uma mulher velha e uma mulher jovem e vice-versa eternamente.